Abro mão da estabilidade estéril
que me impede de crescer.
Sou como a chuva que um dia foi
lago, riacho e oceano. Ascendi com o beijo quente dos raios de sol e hoje me
derramo para fertilizar outras vidas.
Abro mão da rigidez que me
convida a ser sempre a mesma coisa.
Sou como as estações que se
sucedem e povoam de flores, frutos, chuva e sol o ano dos seres - cada coisa em
seu tempo e lugar.
Abro mão da acomodação preguiçosa
que traz segurança e ao mesmo tempo cristaliza as ações heroicas que minha alma
quer realizar.
Sou como a borboleta que arrisca
rasgar seu casulo e sair. Sobretudo porque a natureza não lhe oferece um
convite - nesse caso ela é imperativa.
Minha vida segue feliz pois sei
deixar uma margem e partir para outra.
Minha vida segue feliz porque sei
quando é o momento de fechar um capítulo em minha história.
Minha vida é feliz pois agradeço
a tudo o que já me chegou pela contribuição que trouxe e, com o peito cheio de
paz, despeço-me, abrindo assim espaço para novas experiências.
Não retenho, não enclausuro nem
me apodero daquilo ou daqueles que chegam a minha vida, apenas reconheço o que
sinto para em seguida deixar ir, abrindo espaço para o que vai chegar.
Não me desespero, não me aflijo
nem blasfemo com os instantes de desfazimento que uma perda ou uma
transformação promovem. Antes, agradeço a Deus pelo bem que é a renovação
contínua.
Portanto, deixo ir.
Sou feliz em ver que o momento de
construção sempre aparece depois do momento de destruição. Sou feliz por saber
que sou uno com o fluxo da vida.
Sou como a água da chuva que se
recicla, estações que chegam e se vão demolindo e construindo as paisagens, e
borboleta que arrisca voar mesmo tendo passado parte da vida presa ao chão.
Com reverência, deixo ir o que é
velho para abraçar o novo em minha vida.
Sou feliz, também por ser capaz
de desenvolver em mim o amor desapegado.
Texto para meditação de Kau
Mascarenhas (do livro "Mudando para Melhor" - ed. Altos Planos)
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